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O que achei de O Beco do Pesadelo

Se existe um dito popular que resumiria muito bem esta obra de Guilhermo Del Toro seria “O mundo dá voltas”.

Na década de 40, Bradley Cooper vive Stanton Carlisle, um pobre homem sem rumo que cruza com um circo itinerante e acaba contratado por Clem Hoatley (Willem Dafoe) para ajudar na desmontagem e montagem das estruturas que compõem as atrações. Com o tempo, ele chama a atenção da vidente Zeena (Toni Collette) e de seu marido mentalista Pete (David Strathairn), aprendendo, aos poucos a arte deste último. Desta forma, Carlisle enxerga uma forma de mudar de vida.

São muitas as atrações do Circo, como a de Bruno, o “homem mais forte do mundo” (Ron Perlman) e a do Major, o “menor homem do mundo” (Mark Povinelli). Há também o Selvagem, uma “criatura metade homem metade fera”, e a bela Molly (Rooney Mara), que é capaz de suportar que uma descarga elétrica passe pelo seu corpo sem maiores danos.

Claro, são todos artifícios muito bem desenvolvidos, alguns de forma legal e outras ilegais, para enganar o público em troca de dinheiro a fascínio.

Toda a primeira parte do filme, que é bem destacada do restante da trama, apresenta a vida de Carlisle em meio ao circo, aprendendo com Pete e os outros, além do início de sua paixão por Molly. Dois anos de passam desde que os apaixonados decidiram sair do circo, em busca do sucesso com o que Carlisle aprendeu.

O MENTALISTA E O SELVAGEM

A habilidade de um mentalista é a de ler os sinais que as pessoas passam sem mesmo perceber. Desta forma, o profissional consegue “ler a mente” de uma pessoa ou “conversar com os mortos”. Pete desenvolveu um método para atuar com sua esposa, baseado em gestos e palavras que informa a ele, fatos e impressões que, somadas as capacidades de observação do próprio, permitem a ele passar-se por alguém com um sexto sentido.

Carlisle e Molly passam a realizar apresentações baseadas nestes ensinamentos de Pete, utilizando-se ainda das anotações secretas deste último. Em um momento Carlisle, ao ver Pete adormecido, tenta dar uma olhada no caderno de anotações. O homem mais velho desperta e impede, dizendo que as suas técnicas podem ser perigosas em mãos erradas.

O selvagem é um homem sujo, alcoolizado e drogado de ópio, que despido de qualquer humanidade, é capaz de matar e devorar galinhas vivas com as mãos e a boca. Clem, dono do circo, explica a Carlisle como ele prepara uma armadilha para atrair bêbados, andarilhos e pessoas sem esperança para esse show. E sim, muitas pessoas são capazes de pagar para ver tal cena, o mais baixo nível que uma pessoa pode chegar, deixar toda a sua humanidade de lado, passando a ser visto como um animal, para a satisfação de uma audiência.

A vida de Stanton Carlisle é uma mistura dos dois.

O GOLPISTA

É aqui que Carlisle conhece a psiquiatra Lilith (Cate Blanchett). Ela tenta surpreender o mentalista em uma de suas apresentações, mas acaba sendo superada por este. aqui cabe uma crítica, por toda vez que Carlisle utiliza suas habilidades de dedução, uma cena explicativa vem a seguir, mostrando como ele descobriu as informações. Por mais que nós como expectadores adoramos saber tais coisas, já sabemos que tudo não passa de um truque, e toda esta exposição não é necessária. Mas não é algo que atrapalhe o ritmo do filme, em suas quase duas horas e meia.

Deslumbrados um com o outro, Carlisle e Lilith se unem para enganar alguns milionários, utilizando-se de algo que Pete e Zeena alertavam, nunca se passar por médium.

O TOQUE DEL TORO

Conhecido por seus filmes com criaturas fantásticas que flertam com o surrealismo, aqui Del Toro não tem realmente um ser fantasioso para criar, mas a sua faceta não deixa de ser evidente. Podemos dizer que o verdadeiro mostro é o circo. Decrépito, sujo, cheio de falhas e pessoas controversas, mesmo depois que Stanton Carlisle o deixa, parece que aquele ambiente o acompanha aonde quer que ele vá.

Nestes dois terços finais do filme, Del Toro consegue impor seu ritmo mesclando terror e drama noir muito bem, deixando claro que não precisamos de uma criatura estranha e monstruosa para nos aterrorizar. As nossas próprias ações podem ter consequências desastrosas e fatais.

Guilhermo é um grande diretor e em O Beco dos Pesadelos isso fica novamente evidente. Comandando um grupo de atores excelentes, que entregam com perfeição os personagens, principalmente no circo. Toda a ambientação, com o uso perfeito dos cenários de época e dos figurinos, nos transporta para aquela época do pré-Segunda Guerra Mundial.

Ouso dizer que O Beco do Pesadelo é um filme com leve ar lovecraftiano, com aquele terror inenarrável invisível, mas sempre à espreita.

CONSEQUÊNCIAS

No início Carlisle se sente intocável, um gênio, mas cada vez mais que se aprofunda no golpe, a pressão para resolver as situações o leva para as inevitáveis consequências de seus atos. E mesmo quando Zeena o alerta novamente do perigo de se trilhar este caminho, ele acredita ser capaz de mudar seu iminente destino como se fosse uma simples carta de cabeça para baixo.

Já distante de Molly, atormentado por um ato inescrupuloso de seu passado e outro que o impulsionou a sair do circo, a “volta que o mundo dá” transforma Carlisle em algo nada mais, nada menos que desumano. E ele tem plena consciência disso.

o perfil do filme no IMBd e no Rotten Tomatoes.